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Tum pavor sapientiam omnem mihi ex animo expectorat

O céu estava vermelho. Zéfiro desfilava sobre as dunas de areia e pedras em um desfiladeiro inóspito, que ressoava a própria morte. Os sons desapareceram, bronze contra bronze. “Eu não deveria estar aqui”, pensava o herói mortal, agarrando-se desesperadamente à bainha de sua espada, suja de sangue seco. “Eu não deveria estar aqui”, repetia para si mesmo, amedrontado com o que seus olhos enxergavam, ainda feridos pela luz incandescente de uma chama eterna.

Impassível, a Esfinge penetrava a armadura do homem à sua frente, perfurando sua alma com a força de mil adagas. Sentia a costela quebrada e o pescoço jorrando sangue quente, mas aquilo não era a dor – era a brisa das montanhas de Maratonia que enchiam os seus pulmões, era a noite fria mesclada com o aroma de azeite fresco e água salgada.

Ajoelhou-se em desespero, reconhecendo o absurdo. Suas mãos trêmulas ainda lutavam contra o inevitável declínio. Quase conseguia ouvir os remos de Kháron se aproximando, produzindo ondas que perturbavam a calmaria do rio Estige. “Ele veio me buscar”, se forçava a admitir, resignado pela própria brevidade.

A enorme cabeça da esfinge, de olhos reluzentes como rubis, observava. Era um exame amoral, pálido. Vnuquisque sue noverit ire via. Cada um segue o caminho que escolheu para si. Ela continha toda primavera; a luz do sol e o cheiro suave de flores mortas.

Queria gritar, mas só existia o silêncio.
Inimigos caíam em todos os lados. Ali, só existia o silêncio.

Somos todos estrangeiros, velho amigo.
Atravessando o infinito.
Temos quinze anos, quinze minutos, quinze segundos.
Carregamos, no âmago de nossas almas, a sabedoria de Lucrécio.

“inter se mortales mutua viuunt,
Et quase cursores vitai lampada tradunt

Os mortais partilham a vida
assim como os corredores se repassam a tocha”

Nada começou. Nada acabou.

Nada te pertence.