O ano era 168 d.C.
O imperador Marco Aurélio encontrava-se doente, debilitado pela longa campanha contra os bárbaros germanos, que insistiam – com um vigor nunca visto antes – em transgredir as fronteiras e desafiar as leis do grande Império Romano. Depois de mais de um século de relativa paz, os mercenários do Norte, sedentos por sangue e destruição, se aproveitavam do relaxamento das Legiões militares de Roma para orquestrarem ataques violentos nas fronteiras romanas.
O anúncio de uma nova era estava chegando. As pequenas vilas haviam sido invadidas e massacradas, e os germânicos não pouparam sua crueldade ao trucidar homens, crianças e mulheres romanas e gaulesas. Sangue estava sendo derramado no solo imperial. Roma precisava reagir.
Carregando um pequeno bloco de anotações, Marco refletia sozinho sobre a sua incômoda situação, consternado com o destino que os deuses o haviam imposto. Ele não era um guerreiro; foi formado para ser um diplomata e um filósofo. Todas suas habilidades eram secundárias nesses tempos de guerra: o momento exigia que a espada do Império fosse novamente alimentada com sangue, preservando os cidadãos da sede de vingança bárbara que há tanto tempo encontrava-se adormecida nas geladas florestas da Germânia.
Essas anotações ficaram para a posteridade, conhecidas pelo título de “Meditações”:
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Livro II – “Meditações”, de Marco Aurélio. Editado por Ceriblog.
“Ao despontar da aurora, faço essas considerações: encontrarei com um indiscreto, com um ingrato, com um insolente, com um mentiroso, com um invejoso, com um não sociável. Tudo isso lhes ocorre por ignorância do bem e do mal. Mas eu, que observei que a natureza do bem é o belo, e que o mal é vergonhoso, não posso receber dano de nenhum deles, pois nenhum me cobrirá de vergonha. (…) Isso é tudo que sou: um pouco de carne, um breve fôlego vital e uma força interior. Abandone os livros! Não me distrairei mais; não é permitido para mim. (…) Reflete assim: és velho, não aceite por mais tempo ser um escravo, não arraste-se como uma marionete atraída pelos instintos egoístas, não fale mal sobre o destino do presente e não tema o futuro. (…) Não permita que te arrastem os acidentes exteriores; procure tempo livre para aprender algo bom e pare de ficar girando igual à um peão.
Tenha convicção de que seu tempo sempre está acabando, e que você pode sair da vida em qualquer momento. Faça, fale e pense todas e cada uma das coisas em consonância com essa simples ideia.
O tempo da vida humana: um ponto. Sua substância: um fluxo. Sua sensação final: trevas. Sua alma: um redemoinho. Sua felicidade: algo difícil de prever. Em poucas palavras: tudo o que pertence ao corpo é igual um rio que flui. A vida, a guerra, o instante, o esquecimento. O que pode, então, ser nossa companhia?
Única e exclusivamente a filosofia. E ela consiste em preservar o seu caminho interior, isento de danos e ultrajes, sendo dono de seus próprios prazeres e dores, sem fazer nada ao acaso, e sem valer-se da mentira e da hipocrisia.
Não ajas contra tua vontade, nem de maneira insociável, nem sem reflexão, nem arrastado por opiniões de outros. Não coloque uma máscara em seus pensamentos. Seja fiel aos deuses que habitam dentro de ti, porque eles são os verdadeiros protetores e guias do homem venerável”
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