*Trecho retirado do livro “Making Movies”, de Sidney Lumet. Traduzido e editado por Ceriblog

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“Há não muito tempo atrás li uma crítica de Carlito’s Way , dirigido por Brian de Palma. O crítico era um admirador de seu trabalho, como eu sou. Ele escreveu que De Palma havia encontrado um ‘estilo’ visual que era ideal para tragédia. Na verdade, eu vejo um problema  com isto. Carlito’s Way não é uma tragédia. Na mesma crítica, ele escreveu que o filme era uma “peça convencional de gênero”, acrescentando que “não existe maneira de pensar neste filme como um trabalho coerente”, e terminando o texto chamando o filme de um “material superficial, comercial”.

Meu problema não é com De Palma ou com o filme. Meu problema é com o crítico.

Discussões sobre ‘estilo’ como algo totalmente diferente do conteúdo do filme me deixam louco. A forma do filme sempre segue uma função narrativa. Eu compreendo que existam diversos trabalhos artísticos que são tão belos que não precisam de justificativa. E talvez alguns filmes não queiram mais nada além de serem bonitos na tela, ou apenas proporem exercícios/experimentos visuais. E os resultados destes filmes podem ser emocionais, porque eles foram feitos com este propósito, de serem lindos. Mas não podemos começar a usar termos presunçosos como “estilo visual ideal para uma tragédia”.

Fazer um filme sempre foi sobre contar uma história. Alguns filmes contam esta história e deixam você com um sentimento. Alguns contam uma história, te proporcionam um sentimento e te dão uma ideia. Alguns contam uma história, te deixam com um sentimento, te dão uma ideia e revelam alguma coisa sobre você mesmo e sobre todos ao seu redor. E com certeza a maneira que você escolhe contar uma história tem que ser relacionada com o que a história quer dizer.

É apenas isto que ‘estilo’ quer dizer: a maneira que você conta uma história. Depois da primeira decisão crucial na criação de um filme (“Sobre o que é esta história que eu quero filmar?”) vem a segunda pergunta mais importante: “Agora que eu sei sobre o que é a minha história, como eu devo contá-la?”. Essa decisão vai afetar todos os departamentos envolvidos na produção do filme.

Críticos que falam sobre “estilo” como algo separado do conteúdo do filme são ruins, porque eles precisam que alguma coisa seja óbvia. A razão pela qual eles precisam que algo seja óbvio é porque eles realmente não entendem a Arte. Se o filme se parece com um comercial da Coca-Cola ou da Ford, eles acham que este é o estilo. E até existe estilo ali. É um estilo criado para vender algo que você não precisa, e que é pensado especialmente para atingir este objetivo.  

(…)

Alguém um dia me perguntou como era ‘fazer um filme’. Respondi que é como montar um mosaico. Todo take é como uma pequena peça. Você colore isto, molda, e enfeita o melhor que pode. Você faz seiscentas ou setecentas destas pecinhas, talvez mais de mil. (Podem existir facilmente mais de mil takes em um filme). Então você literalmente ‘cola’ todas estas peças juntas e espera encontrar a imagem que você imaginava desde o princípio. Mas se você espera que seu mosaico, no final, se pareça com qualquer coisa, é essencial saber qual é seu objetivo na história antes de começar a construir cada um dos seus tijolinhos.

Quando estamos assistindo pela primeira vez as cenas de um filme – no dia seguinte que foram gravadas – o maior elogio que podemos dizer uns para os outros da equipe é: “Ótimo trabalho. Estamos todos fazendo o mesmo filme.”

Isto é estilo.”