Texto escrito em 13 de fevereiro de 2008. Reeditado por Ceriblog.
Vozes se misturavam e, irreconhecíveis, beiravam um ruído homogêneo; era a mesma coisa de sempre, a sinfonia de qualquer bar lotado. A fumaça impregnava o ar.
Em um dos lados do balcão estava um velho, acompanhado apenas de seu copo de uísque e do cigarro queimando em cima de um cinzeiro usado. Não parecia feliz, nem triste. Parecia que há muito tempo não ria, ou chorava. Uma completa indiferença dominava o universo de seu olhar. Era o mesmo olhar do boi que, na fila do matadouro, espera pelo abate inevitável do destino.
Alguma coisa me aterrorizava profundamente na figura desse homem. Talvez fosse o movimento mecânico que fazia ao tragar seu cigarro, ou tomando mais um gole demorado em seu copo. Ele não parecia sentir o gosto de coisa alguma. Parecia enclausurado em si mesmo, incapaz de apreciar os simples prazeres, ignorando completamente os presentes dionisíacos espalhados pela madrugada.
Pensei comigo mesmo: essa impermeabilidade funesta do velho só podia ser fruto de uma longa existência – talvez longa demais – soterrada por sonhos esquecidos, amores inacabados, frases não ditas. Cicatrizes que, por algum motivo, nunca deixaram de fazer parte do seu coração.
Mas a vida pode ser diferente disso? Não somos, todos, fundamentalmente incompletos?
“O que você tá olhando?”, perguntou um de meus amigos na mesa, apontando para o canto vazio.
“Nada, cara”, respondi, surpreso.
Nada.
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