Na última sexta feira (não por acaso, de número 13) as corujas novamente levantaram voo, buscando observar o terreno enquanto as luzes do mundo se apagavam; enquanto todos os outros seres dormem, os olhos das corujas brilham na escuridão, atentos, vigilantes.

Eu lembro que ouvi essa história da coruja – como uma explicação dela ser a adotada como simbolo da Filosofia – do grande Vagner, em um de um dos muitos churrascos filosóficos que a gente realiza uma ou duas vezes por ano. Pensando agora, parece que faz pouco tempo, mas muita coisa mudou na pequena (e seleta) gangue filosófica desde de 2009 – Vagner virou quase-bispo em Roma, Fernandus de Crispim tem uma filha grande e falante, Adrianius é um mestre cervejeiro, Andrey Andrade é o mais novo motoqueiro selvagem, Grog virou vegano (sério!), Dentie ainda se mantém logicamente consistente e Scoponi, o ancião, vai começar a dar aulas em breve, embaixo de grandes pessegueiros, igual Sócrates. E eu… bom, eu tenho um blog.

Na última sexta-13 nós também brindamos in memoriam o grande Chicão, que atravessou precocemente o rio de Caronte com uma moeda em cada olho e, espero, subornou o barqueiro para também levar um cigarro em uma mão e um uísque na outra.

Esse texto é do passado. Mas Aquiles nunca alcançou a tartaruga.

Postado no Ceriblog em Fevereiro de 2009

“Nós não somos o que gostaríamos de ser.
Nós não somos o que ainda iremos ser.
Mas, graças a Deus,
Não somos mais quem nós éramos.”

O que escrever sobre minha trajetória acadêmica? Olhando para trás, até hoje eu lembro daquele momento em que vi meu nome pela primeira vez entre os aprovados no vestibular da UEL, e meus amigos me cumprimentavam e logo emendavam a seguinte pergunta: “Nossa, mas porque você escolheu Filosofia?”; naquela época eu não tinha a mínima idéia de como responder essa questão, e não pensei mais sobre isso – talvez nas próximas linhas, refletindo sobre o caminho percorrido nesses quatro anos, eu consiga achar uma resposta.

Assim como a maioria dos ingressantes no curso, eu tinha um conhecimento muito limitado da filosofia em si, e quase nenhum contato com textos filosóficos de verdade até entrar na UEL; esses com certeza foram motivos pelos quais eu me deparei com algo muito mais difícil do que eu imaginava a princípio. Sim, a Filosofia de verdade é extremamente cansativa, difícil e, em certos casos (como no estudo da lógica pura), simplesmente repugnante. Apesar disso, para a minha genuína surpresa, ela se mostrou igualmente compensadora – descobri, por experiência própria que a reflexão filosófica tem certas peculiaridades e que, depois de engendrar pelos seus obscuros caminhos, é impossível voltar a ser o mesmo de antes.

Talvez isso ocorra pelo fato de que, desde a primeira aula do primeiro ano, somos forçados a ter contato com inúmeros paradoxos, angústias existenciais e questionamentos intermináveis na busca de um sentido – somos levados a mergulhar para além do senso comum e nos perder na profundidade infinita de um oceano de perguntas sem resposta – compreendemos assim nossa própria insignificância perante um universo de máximas que fazem os mais sábios baixarem a cabeça humildemente, reconhecendo suas ínfimas limitações.

Por ser essencialmente subjetivo, o caminho filosófico é construído de maneira pessoal e particular, e o que aprendemos nele emerge como fruto de nossa singularidade; nosso diferencial em comparação com o mundo. O que posso dizer de concreto ao final de quatro anos é que a reflexão filosófica me obrigou a aprender a escrever, e escrever bem; que aprendi com Jean Jacques Rousseau a ler textos em francês e com Thomas Hobbes a ler textos em inglês; que me apoiei e levei como lição para minha vida os textos de alguns dos velhos e bons filósofos gregos; que filosofia não é auto-ajuda e nem religião (contrariando professores dogmáticos que encontrei pelo caminho), mas que ela de certa forma ajuda, e é tão ou mais intensa quanto qualquer religião; que ali, entre uma discussão filosófica e um jogo de futebol, fiz amigos para o resto da minha vida – Aristóteles que diga a importância de tais amizades.

Talvez a resposta para aqueles meus amigos que, vez ou outra, ainda me perguntam: “Nossa, mas porque você escolheu fazer Filosofia”, seja: “como você pôde não fazer filosofia?”.Eu sei que não é uma boa resposta , e que ela constitui um sofisma – mas talvez , ironicamente, eu também tenha alguma coisa de sofista, porque, hoje, me sinto submerso no rio de Heráclito.