Matéria ‘O Cinema em Londrina’, publicada no jornal O Londrinense
Produções cinematográficas da cidade ganham forma e levam seu nome para festivais dentro e fora do Brasil com prêmios e indicações
Escrito por: Vinícius Fonseca
Hoje, 19 de junho, é comemorado o “Dia do Cinema Brasileiro”. E a cidade de Londrina tem muito do que se orgulhar nessa data. Embora relativamente distante do eixo Rio-São Paulo, o município se notabiliza por suas produções cinematográficas. São curtas, longas e até séries para a televisão sendo rodadas com equipes de profissionais que nasceram ou escolheram a “pequena Londres” como o seu lugar de morada. Algumas dessas obras têm, inclusive, representado o País em Festivais Internacionais.
O cineasta Rafael Ceribelli viveu essa experiência recentemente quando o curta “Inventário” (2019) recebeu o prêmio de melhor curta-metragem (Drama) no Creation International Film Festival (CIFF), em Apple Valley, Califórnia. Este é o primeiro prêmio da obra que já havia sido indicada à categoria de design de produção no RedLine International Film Festival no Canadá. “Esses prêmios e indicações validam o trabalho de toda uma equipe e isso é sempre muito bom”, comemora. Ele lembra que já teve um curta circulando em festivais internacionais, como foi o caso de “A Caça” (2017). Filme que, segundo o próprio cineasta havia sido feito como equipe reduzida e recursos próprios.
Aliás, sobre o set de trabalho e as amizades que são formadas nesse meio, Ceribelli reforça ainda mais o potencial de Londrina para as produções da 7ª arte. “(A cidade), tem sempre jovens criando e se especializando, querendo fazer cinema”, diz ele ao lembrar que se envolveu de forma direta ou indireta em diversas obras locais nos últimos anos.
A efervescente vocação cultural de Londrina, com a realização de festivais em diferentes segmentos – inclusive cinema – e o espírito de uma cidade estudantil com a presença de Instituições de Ensino Superior, dentre elas a Universidade Estadual, e seus cursos voltados à artes são alguns dos motivos elencados para justificar a forte cena cinematográfica da cidade.
As qualidades londrinenses também são destacadas pela roteirista Alessandra Pajolla, que escreveu “Inventário”, além de já ter roteirizado e dirigido o curta “Redenção”, também de 2019. Para ela, embora a cidade esteja fora do eixo Rio-São Paulo, referência da produção cinematográfica nacional, a cidade tem inúmeras vantagens que podem ser aproveitadas. “Londrina tem profissionais excelentes e cursos para capacitar mais gente. Uma cidade com belas locações e cujas produções custam mais barato do que nos grandes centros”, indica.
Como o grande desafio, não só de Londrina, mas de todo o cinema nacional, Alessandra aponta a formação de público. De acordo com a roteirista, é muito difícil para filmes brasileiros competirem com o grande investimento das produções de Hollywood. “Formar o público é um desafio que passa pelo entrave da distribuição. É preciso mais salas e horários”, considera. “Hoje, quando um filme nacional estreia, o público tem que correr para o cinema porque é grande a probabilidade de ficar apenas uma semana em cartaz. Se estrear com algum blockbuster, não tem como competir”, lamenta.
Dono de uma longa carreira na produção cinematográfica e um dos coordenadores da produtora Kinopus, o cineasta Rodrigo Grota concorda que ainda é necessário pensar em formas de aumentar o público, mas pondera que o cinema nacional tem melhorado seus números com o passar dos anos.
Ele cita o exemplo do filme-documentário, “Isto (não) é um Assalto”, que teve mais de 1 mil espectadores ao longo de três semanas, primeiro longa local a ser exibido em circuito comercial na cidade. “Isso sem verba para divulgação. Considero que esse público foi ótimo para um longa que teve um orçamento irrisório de R$ 45 mil”, vibra.
A frente da “Super Família” (2019), primeira série ficcional para TV rodada em Londrina, Grota avalia que a cidade atua tanto de forma decisiva quanto de forma indireta em cada uma das obras que saem daqui. “Gosto da ideia de que a cidade é ao mesmo tempo algo tão presente e também tão oculta. A cidade já tem um imaginário. Nosso papel é tentar nos aproximarmos desse sentimento que, de certa forma, sempre escapa”.
O nome de Londrina levado longe
Em Londrina já foram produzidos curtas, longas, documentários, séries. Produtos cinematográficos que têm circulado o Brasil e o mundo em festivais de cinema. E levado o nome da cidade cada vez mais longe.
O empresário e produtor cultural, Bruno Marconato começou a se interessar pelos trabalhos produzidos aqui em 2014 e desde então veio se especializando na área e compondo equipes nos sets de filmagem.
Marconato lembra que, em 2018, foi aberto um edital voltado ao interior do Paraná, pelo Programa Estadual de Fomento e Incentivo à Cultura (Sisprofice), voltado ao audiovisual e dos sete projetos selecionados, seis eram de Londrina. “Desses eu trabalhei em quatro produções”, lembra ele.
Em “Inventário”, uma das produções com a qual esteve envolvido, Marconato foi responsável pela equipe indicada a prêmio RedLine International Film Festival no Canadá e vê isso como um sinal de que o cinema londrinense tem tudo para ir cada vez mais longe. “A indicação é a prova que as equipes de Londrina estão prontas para extrapolar a cidade e ocupar outros espaços. As produções daqui tendem a crescer em qualidade”, sinaliza.
Para Rodrigo Grota, que também já foi premiado com produções rodadas por aqui, há algo de especial em retratar Londrina e representa-la em festivais pelo Brasil e pelo mundo. “Fico feliz, pois Londrina tem uma história, uma memória afetiva, e os filmes contribuem para que essa paisagem ficcional possa ser ampliada. Quase todos os filmes que dirigi só poderiam ser rodados em Londrina”, diz.
Arranjo Produtivo Local impulsiona o cinema londrinense
A indústria audiovisual em Londrina acaba gerando diversos empregos e movimenta a economia local. Estima-se que sejam gerados aproximadamente 1 mil empregos diretos e até 5 mil postos de trabalho de forma indireta.
Para melhor organizar o setor e dar mais representatividade a ele em âmbito estadual e nacional, foi fundado, em 2017, o Arranjo Produtivo Local (APL), para o fomento do audiovisual, conforme lembra o atual presidente do órgão, Guilherme Peraro. “Reunimos algumas produtoras e cada um contou sobre as dificuldades que enfrentava. A partir disso criamos o APL”.
Segundo Peraro, os “frutos” colhidos por Londrina hoje, remontam a um trabalho de, pelo menos, duas décadas, quando começou a ser idealizado o primeiro festival do segmento na cidade. “Fazer cinema é muito caro. Você precisa de um alto investimento, envolve muitas pessoas, mas com esses 20 anos de aprendizado é muita experiência”, relata.
Ainda de acordo com o presidente do APL, para manter o bom nível das produções no município é preciso formar ainda mais mão de obra qualificada e a instituição pretende se valer do perfil universitário existente por aqui. “Nós temos uma pós-graduação em cinema, mas o objetivo do APL é que possamos ter uma graduação na área aqui também”, revela.
Perspectivas para o Futuro
Embora a produção cinematográfica no Brasil imponha desafios como a necessidade da formação de mão de obra qualificada e a necessidade da captação de recursos através da Agência Nacional do Cinema (Ancine), as perspectivas para o futuro do mercado, em Londrina são as melhores possíveis. “A Ancine vive um momento dramático, com os recursos paralisados, o que afeta todos os projetos não só de Londrina, como do país”, lamenta a roteirista Alessandra Pajolla. “Torço para que essa triste fase passe logo, porque o audiovisual é fundamental para a cultura e também para a geração de empregos”, completa
Para Guilherme Peraro, Londrina tem pessoas interessadas em fazer cinema e isso é importante para garantir o futuro da 7ª arte. E reforça, que a capacitação de pessoas e das produtoras são fundamentais. Também, segundo ele, o arranjo produtivo local tem trabalhado para firmar parcerias com os governos local e estadual para viabilizar recursos para as produções. “O APL tem trabalhado para que esses itens sejam garantidos. Com isso teremos boas perspectivas para o futuro”, acredita.
Animado com o que vê na cena local, o diretor Rafael Ceribelli, tem uma visão otimista para o futuro do cinema do município. “As perspectivas são de gente nova sendo inspirada por uma geração que passou do cinema londrinense. A renovação do pensamento no cinema é o que faz uma cena, a cena nunca é feita de uma pessoa só”.
Para ele, enquanto Londrina mantiver esse espírito cultural, o cinema resistirá, pois tem como uma de suas principais características vencer o tempo. “Um filme marca um momento da vida de todo mundo que participou. Isso que é gratificante. O cinema te dá uma perspectiva de eternidade e enquanto esse sentimento estiver vivo, vai existir cinema”.
Confira a lista com algumas produções londrinenses realizadas entre 2018 e 2019
- A Rainha Negra das Passarelas (Artur Ianckievicz, 2019, curta);
- Dramátika (Guilherme Peraro, Jackeline Seglin, Marina Stuchi, Renato Forin, Rodrigo Grota, 2019, longa-metragem);
- Inventário (Rafael Ceribelli, 2019, curta);
- Nigredo (Auber Silva, 2019, curta);
- O Bispo e o Artista: A Herança Cultural dos Irmãos Sigaud (Luciano Pascoal, 2019, longa-metragem documentário);
- Pequenos Delitos (Rodrigo Grota, 2019, curta);
- Redenção (Alessandra Pajolla, 2019, curta);
- Super Família (Rodrigo Grota, 2019, série de TV);
- Astro Negro (Gustavo Nakao, 2018, curta);
- Grünstadt (Celina Becker, 2018, curta)
- Hiato (Diogo Blanco, 2018, curta);
- Isto (não) é um assalto (Rodrigo Grota, 2018, longa-metragem documentário);
*Dados APL
** Nome dos diretores das produções
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